domingo, 27 de fevereiro de 2011

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Empilhou desajeitadamente a roupa sobre os ombros, abriu a porta quase zangada consigo e com os seus pensamentos, atirou tudo para cima do cesto, pousou os sacos no chão… Suspirou com as mãos apoiadas ao balcão da cozinha olhando lá para fora. A chuva continuava a cair ao mesmo ritmo. Que poderia ter para lhe dizer ao fim de todo aquele tempo… quanto tempo?... dois anos?... ao fim de dois anos?... Seria o mesmo que jantar com um estranho ou com um amigo de infância? Onde iria guardar todo o seu ressentimento e toda a sua saudade? Claro, podia limitar-se a contar tudo o que andara a fazer naqueles últimos… dois anos…, mas primeiro teria de descobrir algum interesse nisso. Era perfeitamente benigno e entediante. Ou talvez estivesse enganada. Porque se fora tudo tão desinteressante teriam de se explicar porque não se haviam permitido participar no tédio alheio. E ela teria de lhe explicar que chegara à conclusão de que eles não tinham as mesmas referências de felicidade, e que não gostava menos dele por causa disso mas não fazia sentido passarem mais tempo juntos. E pronto, o primeiro passo em falso. Daí até ao apocalipse… O que é isso, «referências de felicidade»? Daí até lhe estar a atirar que ele sofria de incontinência de vulgaridades, que a intoxicava com as coisas que não tinham nada a ver com ela, que em nada acrescentavam à sua vida e que ele próprio não passava de entulho… [...]



domingo, 20 de fevereiro de 2011

In fact there are many kinds of control or implicit visual message about how to interact with the city. Here there is more neon than nuance, and food is advertised rather than hunted for and entertainment becomes divorced from ingenuity. I’m not complaining, because it’s about 15 thousand years too late to change direction.


Steve Paxton

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Faz hoje um ano que mudei de casa.

Faz hoje um ano que me deparei com memórias há muito enterradas, faz hoje um ano que tive demasiadas dores nas costas, faz hoje um ano que o Pedro me ligou a caminho de Grândola a falar-me do hostel pela primeira vez (tinha eu os dedos tão frios entre aquelas paredes gélidas e hostis que mal consegui atender), um ano que comecei que a perceber que o namoro que eu tinha afinal não era namoro nenhum.
Num ano aconteceram mais coisas do que eu julgava ser sequer possível. Ainda estou no mesmo sítio mas já fui a mais sítios que, há um ano, jamais acreditaria que podiam acontecer. O pesadelo, com os seus intermitentes pontos de luz, paz e fé, ainda não terminou. Mas já está muito mais perto do fim.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

De repente, levantei-me de um ímpeto da cadeira em que estava, em frente ao pc, e virei costas a tudo a abanar a cabeça e a rir do fundo do diafragma, com uma sinceridade com que há muito não me ria.

É que só nesta semana - e ela ainda não chegou sequer ao fim - o universo já me provou, pelo menos de meia dúzia de vezes diferentes, quão ridículo consegue ser.