domingo, 30 de janeiro de 2011

A partir daqui não há nada. Não há mais nada para a frente, mas também não há nada para trás. Quatro paredes brancas. As pegadas que andam às voltas e acabam por se sobrepor. Nada. Sente-se o vaivém, a corrente de ar, das pessoas que passam de um lado para o outro. Não se sabe por onde entram. Não se sabe por onde saem. Não se sabe por onde sobem. Não se sabe por onde descem. Nada. Quatro paredes brancas. A certeza que não consegue sair dali. A certeza que não é a única personagem. Mais nada.

Não sabe como foi ali parar. Que foi que me disseste que eu tive de esquecer? Sabe a muito custo que pertence àquele mundo, mas o esforço é tão sobre-humano. E compensa? Será que compensa? Que foi que me disseste que eu preferi nunca ter sabido? E a ignorância que mata em poucos segundos. Ou matava... Mas não há (mais) nada a partir daqui. Porque não espero voltar a lembrar-me... Porque não esperava... Porque não espero voltar... Um ano. Um ano para o comboio dar a volta e para quê? Não conhece outro sítio senão as mesmas quatro paredes brancas, que para o efeito até podiam ser duas, ou uma, um grande muro vazio à espera – sempre à espera – que o preencham de várias cores (cores sem nome porque a partir daqui não há nada), que lhe inventem uma vida.

[...]

Porque a partir daqui não há nada. Não há mais nada para a frente, mas também não há nada para trás. Quatro paredes brancas. Será que alguma vez vou ser capaz de viver com este nada? Este nada consciente, pior que o nada de um coma, pior que o nada do pânico, pior que o nada de um choque. Quatro paredes brancas. Como todo o nada só dá para ficar à espera, tudo bem e contigo?, à espera de nada, enquanto se vê as pegadas a acrescentar itinerários às pegadas, enquanto se sente o vaivém das pessoas de uma ponta à outra a fazer corrente, a fazer corrente de ar, a fazer corrente, não se sabe por onde entram, não se sabe por onde saem, não se sabe por onde sobem, não se sabe por onde descem, a passar mais perto, mais longe, a demorar-se mais, menos, enquanto se ainda não bloqueia aquela parte que se alimenta da possibilidade de, tenho medo de estar a enlouquecer. Não sei lidar com esta ausência. De maneira nenhuma., haver alguém no mesmo sítio, na mesma situação, depois do dilúvio.


(2004)

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Amo-te, e isso não muda nada.