quinta-feira, 5 de março de 2009

Com as pontas dos dedos tomadas de anseio percorro estradas e linhas imaginárias atenta aos pormenores que me poderão guiar o caminho. Perco-me em perguntas sobre as cores deste entardecer, deste ocaso que se despenha sem aviso, sobre as texturas deste trepidar suave do asfalto que me deixa indecisa. Gostava de tirar esta venda dos olhos, mas é quando os olhos se abrem que as pontes caem e eu preciso destas pontes. Preciso destas pontes para identificar o som dos teus dedos a aproximarem-se, a subtileza do ritmo de todas as coisas que queres de mim. Preciso destas pontes para saber identificar que é um coágulo que me impede de avançar desta vez, uma massa teimosa que me nega o oxigénio e a invisibilidade. Desejo continuar por estes (per)cursos que só existem na minha cabeça pois não os consigo ver mas sou obrigada a levar as mãos aos joelhos, forçar-me a levantar, contornar este obstáculo. Naufraguei numa teia de proporções quânticas, emarinhada e enredada sem obedecer a leis. Tenho de seguir por um qualquer atalho previsível e repetitivo, enfadar-me, bocejar, olhar para o relógio e contar os dias extra e intermináveis no calendário, a marchar sem irreverência. Sei que é apenas uma qualquer birra, tão antiga como o meu nome, que me impede de observar o padrão dos meus dedos entrelaçados e desatar os nós. Não acabaria por se revelar mais simples, tudo somado? Mas olho em volta de visão amordaçada, respiro fundo e sorrio. Há um secreto e inominável esplendor em toda esta entropia plácida, imóvel, que se acumula e alimenta a si própria como uma avalanche. Há um prazer irrevogável em bater o pé em contrariedade, ignorar triunfantemente o desafio que me apresentas, encher a boca de neve e deixar de esbracejar. Um dia os meus dedos poderão percorrer o filão de partículas indivisíveis em memórias que constituem a tua pele e será indiferente ter os olhos abertos ou fechados. Mas para já prefiro deixar as linhas rectas de lado, embrenhar-me na neblina de fim de tarde de que ninguém fala e abandonar-nos ao caos do esquecimento.

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